domingo, 12 de agosto de 2007

Torga


O HOMEM é, por desgraça, uma solidão:Nascemos sós, vivemos sós e morremos sós."
Dia 12 de Agosto, em plenas férias tive a honra de participar num evento, uma digníssima homenagem ao grande escritor. Este evento , é sem dúvida, para honrar e relembrar a obra literária e o homem que foi Adolfo Correia da Rocha/Miguel Torga. Geralmente as homenagens são a título póstumo...mas pelo menos fazem-se... O reconhecimento das capacidades de um homem/mulher seja ele de índole moral, humana, intelectual, espiritual, etc , é sempre de louvar. As grandes personalidades, as obras deixadas são património valiosíssimo do qual todos nós, nos deveremos orgulhar. Sim ,devemos aplaudir quem é capaz de fazer algo meritório, (uma forma de arte, uma investigação, uma pesquisa)....o que quer que seja ...desde que seja para o bem da Humanidade...Aplaudi-los, se possível em vida. As pessoas costumam ser pouco generosas... Existe uma tendência para a inveja e esta tem força destruidora , tenta anular os que se distinguem. A inveja é uma arma mortífera , tenta neutralizar os que se destacam ...
Torga foi categorizado pelo seu carácter e personalidade , foi conotado como; duro, arrogante , impaciente. A sua individualidade veemente e intransigente manteve-o afastado dos círculos culturais do meio literário/social português. Fazia também parte do "seu património genético", da sua essência, uma intensa consciência individual , em oposição, dedicou grande parte da sua vida ao humanismo e à solidariedade. Os "outros", foram fonte das suas preocupações , principalmente os oprimidos. As injustiças( foi preso pela Pide) e a dignidade da pessoa humana foi inequivocamente uma preocupação para Torga , fossem elas as tiranias políticas ou o próprio Deus.
Miguel Torga, foi um homem que experienciou "na pele" a emigração (com 14 anos foi para o Brasil). Nasceu na aldeia, foi um homem marcado por esta experiência , da vida rural, vivenciou e contactou de perto com as misérias e com a morte, a sua grande compaixão e humanidade revelam a sua grande sensibilidade.
No dia, 12 de Agosto, ouvir falar de Torga (bem e mal), privar com pessoas que o conheceram, como António Arnault, escutar as peripécias das suas vidas , ouvir poetas dizer a sua poesia ...foi um dia de férias diferente...
Aqui fica a minha pequenina homenagem, ao menino rural Transmontano, ao homem/médico/poeta que manisfestou a sua experiência e observação nesta grandiosa forma de arte - a escrita.

"Sísifo

Recomeça....
Se puderes
Sem angústia
E sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.
E, nunca saciado,
Vai colhendo ilusões sucessivas no pomar.
Sempre a sonhar e vendo
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças... "
Prece
"Senhor, deito-me na cama
Coberto de sofrimento;
E a todo o comprimento

Sou sete palmos de lama:

Sete palmos de excremento
Da terra-mãe que me chama.
Senhor, ergo-me do fim
Desta minha condição
Onde era sim, digo não
Onde era não digo sim;
Mas não calo a voz do chão
Que grita dentro de mim.
Senhor, acaba comigo
Antes do dia marcado;
Um golpe bem acertado,
O tiro de um inimigo.....
Qualquer pretexto tirado
Dos sarcasmos que te digo."

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

A solidão dos nossos idosos...


A languidez apoderou-se de mim e da minha vontade de escrever... Afinal, estou de férias!...
O meu trabalho tem sido desenvolvido primordialmente na arte de observar....Mas hoje o meu "eu", o meu "mundo interior" decidiu querer escrever e confraternizar com o meu mundo exterior/envolvente e ...observo...observo...Tantos pormenores , tanta superficialidade/ intimidade ... Para cada estado procuro sempre a sua dualidade , o seu estado oponente...E observo: a correria das pessoas, a ilusão das grandes massas...os centros comerciais repletos...os MacDonalds com filas enormes... Contrariamente, observo especialmente os idosos que estão completamente sós...vazios. Rostos que espreitam na janela das suas casas, procuram desesperadamente " o outro", nem que seja simplesmente a sua imagem... O elo de ligação com o mundo parece ser a janela que os põe em contacto com o mundo exterior, a rua...Será que estes rostos têm família, filhos? Existirão ? Onde estão? O meu coração fica apertadinho...tenho tanta pena...Por que será que os filhos abandonam os seus pais e os netos os seus avós?...Será que não foram bons pais, bons avós?...Mas ouço as histórias ...e observo... Os filhos desculpabilizam-se: não podem ficar com os seus pais (velhos) porque têm de trabalhar, não podem deixar de trabalhar para tomarem conta deles...A vida está "cara", não têm nem tempo, nem oportunidade!!! Eu questiono-me : então, quando os filhos eram pequenos , os pais não precisavam de trabalhar para os sustentarem? Geralmente respondem: bem... iam para os infantários, para as amas, ficavam com a empregada doméstica ou ainda com os avós... Será que os mesmos filhos, agora adultos, não poderão fazer o mesmo pelos seus pais? Levá-los para um centro de dia e ir buscá-los, no final do trabalho, arranjar uma empregada?!...Não haverá outras soluções que não as do abadono?
A solidão , a indiferença são formas terríveis de castigar os que nos amaram...Um dia, seremos como eles e não gostaríamos de nos sentir vazios, insignificantes, nulos, sem valor, carentes, sem afectos , simplesmente SÓS e entregues aos outros, que possivelmente nos tratarão consoante a sua sensibilidade, formação moral e valores. Estaremos então entregues à sorte, às fragilidades, talvez ao abandono...
Que valores, pois, têm sido transmitidos às sucessivas gerações ? Que poderemos nós oferecer aos nossos idosos?